Miniaturas de um dos livros de Irma Boom. Imagem de divulgação.

Sem regras: Por que Irma Boom insiste no controle criativo total

Belinda Lanks
Magenta Brasil
5 min readMar 15, 2017

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E parece sempre consegui-lo.

AA carreira de Irma Boom começou com controvérsia. Então uma jovem designer gráfica, trabalhando no Escritório de Impressão e Publicação do Governo (Staatsdrukkerij) na Holanda, sua primeira tarefa importante foi a criação de um catálogo de selos postais holandeses emitidos em 1987 e 1988. Ela colocou o texto de lado, hifenização evitada, e se concentrou mais no processo de criação dos selos do que na apresentação dos produtos finais. O formato não traditional ultrajou colecionadores profissionais de selos postais e materiais relacionados. Mensagens de ódio chegaram aos montes a ela. Mas também elogios. “Eu ganhei todos os prêmios que pude naquela época,” ela disse ao público em um TED x Delft talk, em 2011, “e todos os inimigos que eu também poderia obter no mesmo período”.

Irma Boom

Desde então, Boom, uma workaholic declarada, aplicou sua abordagem pouco ortodoxa a mais de 300 livros, ganhando mais prêmios ao longo do caminho, incluindo o cobiçado Prêmio Gutenberg, em 2011, do qual foi a mais jovem ganhadora. Experimentando materiais e processos de produção, ela cria obras visuais singulares, que também são exclusivamente palpáveis. Recentemente, para um volume encomendado pelo fabricante de automóveis francês Renault, Boom imprimiu texto e imagens (apresentando peças automotivas, mas nunca o carro inteiro) em chapas de alumínio. Para um livro sobre o perfume Chanel, № 5, ela imprimiu cada página em relevo em vez de usar tinta.

Parte do seu sucesso — a parte que não se refere ao seu talento visionário puro — é a sua insistência no controle criativo. Ela tem peso sobre os fotógrafos e escritores colaboradores e edita todas as imagens. Boom compara a concepção de um livro a construção de um edifício e como uma arquiteta full-service, no sentido de que ela não só determina a forma geral que o edifício vai tomar, mas o mobiliário, iluminação e acabamento dos materiais que irão decorar o interior. Quando os comissários (ela se recusa a dizer que serve “clientes”) dão-lhe carta branca, ela entrega um livro que parece reinventar o meio — e pode até ganhar alguns prêmios.

A rotina

Eu não tenho uma rotina matinal tanto quanto tenho uma rotina noturna, na qual eu faço um balanço de tudo o que tenho que fazer no dia seguinte. Eu definitivamente não tenho uma rotina enquanto faço livros. Cada livro é específico, pois cada assunto é diferente. Uma vez que estou trabalhando em 10 projetos ao mesmo tempo, preciso ser muito organizada e estar muito focada. Eu tenho notas em post-its amarelos por todo lado. Geralmente fico no escritório até meia noite e volto a trabalhar cedo pela manhã, antes de meus assistentes chegarem às 9h30. Para eles, estou sempre aqui e há alguma verdade nisso.

Com 1.200 páginas, “James Jennifer Georgina” é inteiramente sobre cartões postais. Imagem por Irma Boom.

As necessidades do cliente não se aplicam

Eu não uso o termo “cliente”, pois sugere uma relação desigual e servil. Eu uso “comissário” (no sentido de quem encarrega ou incube algo) em vez disso, porque é imperativo para mim estar em pé de igualdade no que tange o respeito e a confiança. Se um comissário e eu não estivermos no mesmo caminho — não ser rápido o suficiente para me acompanhar — não vai funcionar. Eu vou simplesmente ficar incomodada. Enquanto fazer um livro é uma experiência verdadeiramente colaborativa entre o designer e o comissário, é essencial que o comissário me dê total liberdade criativa. Quando tenho total liberdade, dou 1.000% em troca.

Debriefing

Antes de fazer um livro, eu prefiro ter uma reunião presencial para discutir o projeto. É muito mais eficaz falar com comissários e ler sua linguagem corporal do que receber resumos, que são chatos e muitas vezes expressam apenas uma maneira de pensar.

Em miniatura

Eu faço mockups de versões de escala em tamanho real dos meus livros, mas também faço versões em miniatura deles, assim posso ver melhor a distribuição de textos e imagens. Costumo falar de livros como se fosse arquitetura (o subtítulo da minha monografia é “A Arquitetura do Livro”), pois, em formato e forma, eles são como prédios.

Inspiração da biblioteca

Para me inspirar, visito minha própria biblioteca, uma coleção de livros dos anos 1960 e do século XVI e XVII — o que eu considero como o auge do design do livro. Mas também, às vezes, vou a um museu ou vou dar uma caminhada em um parque. Estar em movimento, em vez de ficar olhando para uma tela, é muito importante para o pensamento criativo.

Para um livro em celebração ao Chanel №5, Boom usou tipografia para gravar relevo nas páginas. Imagem por Irma Boom.

Sem música, por favor

Eu não consigo ouvir música enquanto trabalho, pois acho que isso me distrai absurdamente; eu tenho vontade de parar o que estou fazendo e me deixar levar pela música. Mas conversas de rádio eu estranhamente gosto de ouvir de leve ao fundo.

Os arquivos

Tenho papéis espalhados por toda minha mesa — gosto de ter uma visão de tudo o que estou trabalhando e nunca descarto nada de um projeto. A Universidade de Amsterdã mantém o chamado “Arquivo Vivo de Irma Boom” do meu trabalho, então, quando termino um livro, coloco todos os materiais em caixas de papel e o conservador da universidade as leva embora. Eu só os revisito quando estou me preparando para uma retrospectiva.

Esse livro, para o fabricante de carros francês Renault, foi impresso em páginas de metal. Imagem por Irma Boom.

A importância dos prazosThe importance of deadlines

Eu preciso de prazos — livros têm de ser publicados — e eles me dão adrenalina. Mas não gosto de pensar muito sobre eles ou registrá-los por escrito. Eu sei quais são e que vou ao seu encontro. Nunca perdi um prazo.

Que equilíbrio vida/trabalho?

Meu trabalho é minha vida. O filósofo francês Baudelaire disse: “A inspiração surge do trabalho diário”, e eu concordo totalmente. Eu também trabalho aos sábados e domingos, 24/7. Mas não crio todos os dias. Como cada projeto que faço é intensamente específico para cada assunto e requer muito pensamento, eu uso o tempo para pesquisar e ler sobre o livro que estou criando. A parte mais interessante e mais demorada é conceituar um projeto. Quando isto está claro para mim, então, é apenas uma questão de execução.

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Editor-in-chief at Razorfish. Formerly of Magenta, Bloomberg Businessweek, Fast Company, and WIRED. For more about me, check out belindalanks.com.