Paisagem dentro do jogo Second Life. Divulgação Linden Labs.

Eliminando as fronteiras entre real e virtual com o Second Life

@Gustavo Teodoro
Magenta Brasil

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Do meu primeiro salário à repetência de ano na escola, como o popular jogo da Linden Lab impactou a minha vida e me mostrou os potenciais do digital.

EE m 2007, me vi com 15 anos de idade e a ambição de ter minha própria casa enquanto passava pela primeira experiência profissional da minha vida. Uma situação aparentemente comum, não fosse o fato de tudo isso ter acontecido no ambiente virtual do Second Life.

Fora do jogo, eu morava com meus pais e tentava passar de ano na escola. Nele, começava minha carreira como vendedor de uma loja de roupas, conhecia outras pessoas e me divertia com as possibilidades da minha segunda vida. Depois de um tempo, me tornei DJ de festas virtuais, chegando a fazer cerca de L$ 6.000 (os Linden Dollars, a moeda virtual do jogo) por hora, o que no “mundo real” era o equivalente a U$ 30 — nada mal para um garoto do subúrbio de Belo Horizonte, certo?

Nesse período, lembro nitidamente da sensação de que o que eu vivia no jogo parecia ter um impacto tão real para mim quanto o que me acontecia fora dele: a convivência e os diálogos com amigos por meio de seus avatares; as novas pessoas que conhecia em festas virtuais; as palestras de profissionais as quais comparecia pelo ambiente do jogo; as responsabilidades com um emprego; e, claro, o dinheiro que ganhava. Com meu salário virtual, fui capaz de ter metade de uma ilha, além do meu próprio castelo, e até comprar coisas fora do jogo.

Ainda que agora eu tenha uma visão mais crítica em relação à dependência que muitos de nós temos com o digital e o enorme tempo que passamos colados aos nossos smartphones, não posso deixar de reconhecer a capacidade que ele tem de possibilitar conexões e experiências diferentes. Muitas delas, inclusive, seriam praticamente impossíveis caso não ocorressem por meio das oportunidades conferidas pelo ambiente virtual.

Meu melhor amigo na minha segunda vida, por exemplo, chamava-se Hugo, um jovem bastante estudioso e profissional, sempre buscando conhecer novas pessoas. Fora do Second Life, no entanto, ele faleceu alguns anos depois de nos conhecermos, baleado por engano no bairro em que morava, em Belo Horizonte. Sei muito pouco sobre como foi a vida dele e seu lugar na sociedade “real”, mas posso assegurar que tivemos momentos divertidos no virtual — e que dificilmente teríamos nos conhecido de outra forma.

Divulgação Linden Labs.

De um modo ou de outro, todas as vivências que tive no jogo impactaram a minha vida fora dele, seja ampliando minhas experiências e percepção de mundo, seja contribuindo para que eu repetisse de ano na escola — para o desespero dos meus pais.

Na época, inclusive, cheguei a participar de um programa de TV sobre a influência da Internet nos jovens devido ao tempo que eu passava no Second Life. Pouco tempo depois, por causa disso, fui selecionado para um projeto que se propunha a ensinar arte e tecnologia para jovens de baixa renda. Foi exatamente isso que me colocou no caminho para me tornar o desenvolvedor web profissional que sou hoje.

Se atualmente encaramos com naturalidade o fato das fronteiras de nossas vidas dentro e fora do digital estarem cada vez mais tênues (ou inexistentes), para muitas pessoas o Second Life foi a primeira grande experiência do tipo. Afinal, o jogo lançado pela Linden Lab em 2003 se tornou um verdadeiro fenômeno cultural, somando centenas de milhares de jogadores em todo o mundo e movimentando uma economia paralela de milhões de dólares. E tudo isso continua até hoje.

Facebook Spaces: uma nova promessa de mundo virtual imersivo.

A julgar por recentes lançamentos e promessas de experiências de realidade virtual como o Facebook Spaces e o projeto Sansar, da própria Linden Lab, ainda não chegamos ao fim das tentativas de recriar nossas dinâmicas sociais no virtual. Resta saber se, em meio ao contexto hiperconectado que vivemos, elas serão capazes de causar tanto impacto quanto o Second Life.

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Staff Web Engineer - From Belo Horizonte (Brazil) based in Vancouver (Canada)